Foto: Irmãs de Notre Dame de Namur

Pela Irmã Judi Clemens
Irmãs de Notre Dame de Namur

Faz 15 anos que Dorothy Stang, uma Irmã de Notre Dame de Namur de Ohio, foi morta pelo pistoleiro contratado por fazendeiros gananciosos em Anapu, Pará, Brasil.

Quem no mundo teria imaginado que a descoberta de uma nova espécie de corujinha-do-xingu na Amazônia, entre os rios Tapajós e Xingu, receberia o nome científico de Megascops stangiae em homenagem a ela?

Ir. Judi Clemens

Gosto de pensar que Dorothy acharia isso absolutamente fascinante e uma grande alegria! Para mim é tão adequado.

É um símbolo de sua vida, sua insistência em lutar contra o desmatamento e os efeitos sobre os animais e as pessoas, especialmente os que ficaram pobres. Ela sempre chorava quando ouvia um macaco chorando porque já não havia cobertura na floresta que havia sido o lar deles por séculos.

A natureza era o lar de Dorothy, e eu me lembro que, quando a visitávamos, sentávamos à noite do lado de fora para contemplar as imagens e sons, a música da floresta.

Para mim, essa criatura noturna é um símbolo da vida de Dorothy. Seu canto penetrante, sua percepção de profundidade e o fato de estar em risco de extinção, devido ao desmatamento, refletem porque Dorothy era tão apaixonada por proteger a floresta tropical.

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Dorothy ficaria tão animada sabendo que cientistas, que trabalham com biodiversidade e descobrem novas espécies, buscaram se lembrar dela ao batizar essa preciosa coruja.

Muito antes de começarmos a ouvir sobre a interligação de toda a criação, Dorothy estava imersa nessa crença. O mundo dela sempre foi interligado.

Embora Dorothy e eu tenhamos crescido em Dayton, Ohio, conheci Dorothy no início dos anos 60 no Arizona, onde ela morava. Ela pediu que duas irmãs de língua espanhola passassem o verão ensinando catecismo para jovens em Puerto Peñasco. Naqueles dias era uma pobre vila de pescadores localizada no Golfo da Califórnia.

Minha primeira lembrança de quem era Dorothy veio quando voltamos para o Arizona e ela insistiu em nos levar para visitar o Grand Canyon. Lembro-me de como ela se envolveu profundamente com aquela paisagem!

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Alguns anos depois nos encontramos novamente e moramos juntas em Coroatá, Maranhão, Brasil. Desde os primeiros dias no Brasil, Dorothy sempre cultivou um jardim, plantou flores e colheu árvores frutíferas. Em todos os lugares em que morou, ela deixou um legado da abundância de Deus.

Dorothy teve a missão de migrar com famílias do Maranhão, e ela os seguiu para o oeste, para o Estado do Pará. Continuei trabalhando no Maranhão e visitei Dorothy e seu povo ao longo dos anos.

A última vez que vi Dorothy foi em 1990, quando voltei ao Pará para me despedir. Na ocasião, Dorothy insistiu que eu plantasse um limoeiro no Centro Nazaré onde ela morava antes de se mudar para Anapú.

Quando voltei depois do martírio da Dorothy fiz uma peregrinação no Centro Nazaré e encontrei o limoeiro carregado de lindos frutos.

Desde a infância, a terra era sagrada para Dorothy, onde, em uma família de nove pessoas, um jardim era um meio de sustento e partilha. Dorothy tinha mãos grandes e fortes, e ela sempre dizia que era devido aos jardins de capina na primeira infância.

Dorothy via a terra e sua generosidade como um dom sagrado a ser cuidado em um acordo de “arrendamento” com nosso Deus. Em sua espiritualidade profunda, Dorothy se entregou totalmente ao trabalho com famílias fazendeiras enquanto elas discerniam o plano de Deus para elas.

Eles cresceram na consciência de seus direitos e como usar a terra de forma sustentável. Assim como ela chorou ao ouvir os macacos chorarem, ela ficou profundamente perturbada em face da injustiça e da ganância pela apropriação de terras, vivida por seu povo. Ela era uma migrante com eles e uma fervorosa defensora dos direitos humanos.

Dorothy teria experimentado uma profunda solidariedade com o Papa Francisco. Sua encíclica Laudato Si’ aborda a ecologia integral e a interligação de toda a criação.

Como membros da comunidade global, o legado de Dorothy permanece em nós hoje, e adotamos o convite do Vaticano para participar do plano de sete anos da Platforma de Ação Laudato Si’.

Podemos não ser chamados a dar nossas vidas como Dorothy, mas todos nós somos chamados a agir, em nome do Deus Criador. Somente a mudança sistêmica trará nosso planeta de volta à sua bênção original.

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Irmã Judi Clemens, das Irmãs de Notre Dame de Namur, serve como Presidente da Diretoria dos Voluntários Missionários de Notre Dame.