Domingo, 16 de janeiro
SEGUNDO DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C
João 2,1-11
Nossa caminhada nos passos do evangelho deste domingo nos apresenta a famosa cena das bodas de Caná. Hoje vemos onde Jesus se sente em casa. Esta passagem do Evangelho de João é encontrada depois que os discípulos perguntaram: “Mestre, onde moras”? E continuará com sua entrada no templo com um chicote. Esperamos encontrar Deus no templo e, em vez disso, o encontramos em festa. Desde as primeiras passagens do Evangelho de João, Jesus nos surpreende! Mesmo com seiscentos litros de bom vinho!
O começo do Evangelho de João é estranho. Com tantos problemas no mundo, Jesus lida com vinho? Sendo este o início dos seus sinais, os demais devem ser lidos com base neste. Estamos acostumados a ver o Deus da lei, do castigo, do julgamento. É escandaloso que Jesus se apresente trazendo um bom vinho! Onde Deus mora? Ele vive apenas nos preceitos ou vive na vida cotidiana, na beleza dos relacionamentos, na amizade? Jesus se apresenta assim.
A passagem de hoje começa como sempre com a expressão “naquele tempo”, mas o texto de João se refere ao “terceiro dia”, isto é, depois de os discípulos terem perguntado “onde moras?”, dando-nos já uma importante referência temporal. O terceiro dia é o último dia, a ressurreição. Essa questão surgiu, por sua vez, em um “terceiro dia” da semana inaugural do relato joanino. Sendo assim, o evangelista quer nos dizer que estamos no sexto dia, o dia em que o homem foi criado, a realização da Criação, o dia que se prepara para o descanso. De fato, a cena apresenta, como no final das Escrituras, uma cena de casamento. De fato, o Antigo Testamento termina com o Cântico dos Cânticos.
Deus nos dá ordens, mas todas as leis de Deus devem ser sempre lidas com um olhar nupcial, com sentimento de amor. Sem amor, mesmo a observância meticulosa de todos os preceitos permanece vazia. Corre-se o risco de cometer o erro do “irmão mais velho”, que cumpria todos os deveres na casa do pai misericordioso, mas não entendia seu amor. Há uma festa lá também, e o irmão mais velho não entende. Toda a aliança com o povo de Israel é uma aliança de casamento. O povo de Deus é frequentemente associado à imagem da noiva. Adão e Eva, desde os primeiros versos, fogem desse amor por medo, e Deus os procura. É um pouco de toda a história de Deus com a humanidade, uma busca animada pelo amor que termina, na Sagrada Escritura, com a cena nupcial do Apocalipse.
A mãe de Jesus está lá. Os vasos de pedra estão lá. Jesus a chama de ‘mulher’, ela é a noiva que ama a Deus. Ela fica sem vinho. Um sinal preciso: enquanto o pão e o azeite são essenciais para a alimentação, o vinho é algo mais, mas indispensável para ser humano, para alegrar o coração: se nos limitarmos apenas a comer e beber, somos animais! A humanidade, por outro lado, vive para se alegrar. Falta o vinho, experiência que muitas vezes experimentamos: talvez tenhamos fartura de comida, trabalho, serviços, bem-estar, mas falta-nos alegria, amor, sentido de vida. A vida, quando retiramos a necessidade de buscar “pão e azeite”, perde sua dimensão festiva, sua relação com os outros.
É Maria quem percebe isso. “Eles já não têm vinho”: a função de Maria é representar a humanidade na relação com Deus, aquele a quem ela acolhe e com quem fala. Aqui em Caná como aos pés da cruz, Jesus não a chama de ‘mãe’, mas se refere a ela como ‘mulher’. Não é um tom depreciativo, longe disso, mas tem um significado profundo: Maria é mãe, e também é mulher, é noiva, é aliada. Até mesmo a expressão “Que há entre mim e ti?” indica, na linguagem diplomática das alianças da época, a expressão “tanto a mim quanto a ti”, usada durante as disputas para reafirmar os deveres recíprocos da aliança. Se não há alegria, não há vinho, isso é o que importa para você, pois você é meu aliado!
“Minha hora ainda não chegou” também pode ser lido como “Minha hora já não chegou?” (lembre-se que nos códices antigos não havia pontuação, então é provável que a expressão fosse uma pergunta). De fato, pelo resto da passagem, vemos que para Jesus chegou a hora dele! Finalmente é hora de trazer vinho e alegria para a humanidade!
Agora é a hora, não devemos esperar por um futuro indefinido. Agora devemos agir, apenas retirar o vinho, porque o Senhor já está presente. A resposta de Maria não contradiz o que Jesus diz, mas segue a pergunta de seu filho. É ela quem fala aos criados, que – talvez não percebamos – são os verdadeiros arquitetos do prodígio. Quem realiza materialmente o milagre, com uma ação concreta, não é Jesus, cuja ação permanece “imóvel”, mas os servos que enchem os vasos com água e levam o vinho à mesa do patrão. “Fazei o que ele vos disser” lembra a expressão do povo de Israel depois de receber a lei da aliança, na qual diz “faremos o que dizem todas estas palavras”. Esta é uma nova aliança.
A mãe e os vasos “estavam lá”: há uma semelhança entre a irmã água e Maria, como sempre gostamos de notar no Cântico das Criaturas, em que Francisco define a água como muito útil, humilde, preciosa e casta, com quatro adjetivos representando a Virgem. Os vasos são seis, o número do ser humano – no sexto dia ele foi criado – e o que acontecerá neste casamento é a criação da nova humanidade. A água é o elemento primordial da criação. Os jarros são feitos de pedra, uma lembrança das tábuas da lei esculpidas em pedra. Falamos da purificação dos judeus, dos ritos, das práticas da lei. Mas os jarros estavam vazios: não havia sentido em viver!
Jesus manda enchê-los. Quantas vezes a nossa vida está toda em ordem, nas obrigações, até na nossa compreensão de sermos criaturas, nos preceitos, mas depois percebemos que esta mesma vida é vazia. Somente Cristo pode preencher toda esta ordem com significado! A água é o desejo do homem; Jesus nos pede para usar a água para encher a vida, para enchê-la de desejo. É a água que se torna um belo vinho! Em vez disso, muitas vezes somos bons em transformar o vinho do Evangelho em água, em “dilui-lo”, em falar apenas dos preceitos, da tristeza.
Mergulhe naquela água que é Cristo. Ele é o homem completo, o homem perfeito. Vamos extrair dele agora! Mas é só água? Não, já é vinho, já é beleza, já é alegria, numa quantidade imensurável, seiscentos litros. Você pode extrair sempre, está sempre disponível! Quão bela nossa vida pode se tornar, se tomarmos essa consciência! O milagre nem é contado. Não nos interessam os detalhes de como a água se transforma, mas sim que o vinho é muito bom. O milagre, se você pensar bem, está em ouvir os servos. O milagre são os servos que ouvem. Imagine se todos os seres humanos agissem ouvindo a palavra de Deus, quantos milagres em nosso lindo planeta!
O mestre-sala é o conhecedor, o mestre da lei, o teólogo, e na história ele aparece diante do noivo. O noivo é na verdade Jesus, aquele com quem o sommelier conversa. O mestre da lei não sabe de onde vem esse vinho novo porque ele mesmo não o produz. Esta nova teologia trazida por Cristo só é compreendida por quem a vive, por quem a experimenta, mesmo na humildade da vida cotidiana. De fato, os servos sabiam bem de onde ele vinha!
Todos servem primeiro o melhor vinho. Em nossa vida, muitas vezes experimentamos primeiro o belo vinho, em tenra idade, no início de nossas relações humanas, em nosso trabalho, em nossas paixões. Depois, lentamente, com o tempo, quando estamos um pouco bêbados, o vinho ruim, a decadência, a velhice. Quase como se na vida estivéssemos todos destinados a uma perene parábola descendente. Em vez disso, com Cristo, o paradigma muda. Podemos ter uma oportunidade se optarmos por extrair muito desses jarros de pedra. Deus deseja que em nossa vida, em cada idade, vivamos nossos desejos em plenitude, em doçura, em beleza. O verdadeiro pecado é desistir desses desejos.
Este é o início dos sinais. Não é apenas um “milagre”, mas um sinal, algo misterioso a ser totalmente compreendido. O milagre é algo estranho, antinatural. O sinal é algo que encontramos na vida cotidiana, mas que pode ter uma mensagem especial. Não é importante o que você faz, mas o que você comunica. Ele é o vinho, ele é o noivo! Esta é a sua glória, o homem que se alegra, a humanidade viva.
Como diz São Francisco: “‘Nós somos os jograis do Senhor e nisto queremos a vossa remuneração, isto é, que estejais na verdadeira penitência’. E dizia: ‘Que são os servos de Deus senão, de algum modo, uns jograis seus, que devem mover o coração dos homens e levanta-los para a alegria espiritual?’.” (Legenda perusina n. 43)
Há seis vasos. Seiscentos litros de vinho! Pense no que uma abundância de amor nos espera, se apenas optarmos por mergulhar nesses vasos. Sinceramente desejamos a você um feliz domingo!
Laudato Si’!