Se queremos salvar nossa casa comum, a hora de fazer mais é agora.

O Grupo de Trabalho III de Mitigação das Mudanças Climáticas do IPCC se soma a um conjunto já muito robusto de evidências de que a produção de combustíveis fósseis precisa ser enfrentada de frente e rapidamente, e afirma que as medidas de mitigação não podem compensar o atraso das reduções de emissões em outros setores.

Os combustíveis fósseis são a principal causa da crise climática, respondendo por cerca de 85% das emissões de CO2 em 2019. Os governos estão ignorando a ciência e continuam piorando o problema. As emissões de combustíveis fósseis aumentaram 67% entre 1990 e 2019.

Os fluxos de financiamento público e privado para combustíveis fósseis ainda são maiores do que aqueles para adaptação climática e mitigação de problemas relacionados ao clima (alta confiança), afirma o Sexto Relatório de Avaliação (AR6) divulgado esta semana pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

Os planos para aumentar a produção de combustíveis fósseis vão explodir o orçamento de carbono. As emissões associadas à infraestrutura de combustíveis fósseis atualmente existente e planejada nos levariam além da meta de 1,5°C. Mas interromper novos projetos não é, por si só, suficiente. Devemos eliminar gradualmente a produção que já existe. Mesmo que nenhum novo projeto de combustíveis fósseis fosse construído a partir de hoje, as emissões da atual infraestrutura de carvão, petróleo e gás ultrapassariam o orçamento de carbono de 1,5ºC em mais de 130%.

Os governos devem trabalhar juntos para fazer uma transição equitativa e evitar ativos ociosos. Como se lê no novo relatório do IPCC, “limitar o aquecimento abaixo de 2⁰C deixará inutilizados os recursos de combustíveis fósseis e encalhará a infraestrutura a eles relacionada. O valor combinado dos ativos ociosos foi estimado em 1 a 4 trilhões de dólares”. É necessário um tratado global para gerenciar esse risco e permitir que a transição ocorra na escala necessária para enfrentar a crise climática.

Por ser repleta de diversidade e complexidade, a natureza sustenta nossas economias e nossas sociedades. Recentemente, na UNEA 5.2 e nas conversas preparatórias para a Conferência sobre a Biodiversidade da ONU (COP 15), houve um apelo para viver em harmonia com a natureza e uma ênfase no enfrentamento das crises climática e da biodiversidade conjuntamente.

Coletivamente, temos o conhecimento, a tecnologia e os recursos, em todos os setores, para proteger e restaurar nosso mundo natural, fazendo a transição para um futuro positivo para a natureza que beneficiará nossa saúde, economias e nosso futuro.

“Não podemos esperar para proteger habitats e sequestrar carbono suficiente se quisermos ficar abaixo dessa linha crítica de 1,5°C.”

Eric Dinerstein, Diretor do programa de Biodiversidade e Soluções para a Vida Selvagem, RESOLVE

“A coisa mais simples e barata que podemos fazer para ficar abaixo de 1,5 graus é proteger 50% da superfície terrestre, marinha e de água doce.” Eric Dinerstein, Diretor do programa de Biodiversidade e Soluções para a Vida Selvagem da RESOLVE

No entanto, não é tarde demais para baixar a curva de declínio da biodiversidade. Ações como a guerra na Ucrânia e o aumento do preço dos combustíveis fósseis ressaltam a necessidade de novas propostas ousadas, como o Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis, para eliminar gradualmente o petróleo, gás e carvão e fazer com que o mundo caminhe rapidamente para soluções de energia mais limpas, seguras e bem distribuídas. Deixar pelo menos 50% do planeta para a natureza é a ação mais rápida e eficiente que podemos fazer para resolver a dupla crise das mudanças climáticas e extinção de espécies, e proteger os meios de subsistência de 1,6 bilhão de pessoas.

Pe. Joshtrom Isaac Kureethadam, Coordenador de Ecologia e Criação do Dicastério para a Promoção do Desenvolvimento Humano Integral do Vaticano

“Há algum tempo falamos sobre o Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis, que pode enfrentar a maioria das nossas crises: a crise climática, a perda da biodiversidade, a crise ecológica em geral e também uma questão de paz”, apontou o Pe. Joshtrom Isaac Kureethadam, Coordenador de Ecologia e Criação do Dicastério para a Promoção do Desenvolvimento Humano Integral do Vaticano, durante um webinário do Movimento Laudato Si’ em 10 de março

O mundo usou tratados no passado para gerenciar, restringir e eliminar perigos, como armas nucleares e minas terrestres. Hoje, nosso mundo precisa de um Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis como complemento ao Acordo de Paris, que oferece o mecanismo que faltava para o fim da expansão dos combustíveis fósseis, uma redução gradual da produção e a cooperação internacional necessária para gerenciar uma transição global justa.

O impulso que sustenta o apelo por um Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis se fortaleceu significativamente, incluindo 101 ganhadores do Prêmio Nobel, 3.000 cientistas, mais de 40 cidades, 170 parlamentares, 2.000 jovens ativistas, um grupo crescente de líderes religiosos e dezenas de milhares de outras pessoas.

Tzeporah Berman, Diretora de Programas Internacionais, Stand.earth; Foto: Jamie Kowal

Tzeporah Berman, Presidente da Iniciativa do Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis e Diretora de Programas Internacionais da Stand.earth, declarou: “Este relatório deixa claro que agora estamos enfrentando uma armadilha perigosa de emissões de combustíveis fósseis e ativos ociosos que desestabilizarão ainda mais nossa economia e sociedade. Isso ocorre porque governos e empresas continuaram expandindo de forma imprudente os projetos de petróleo, gás e carvão. Um novo tratado global de combustíveis fósseis pode ajudar os países a gerenciar esse risco e restringir a produção de maneira rápida e justa, na escala necessária para enfrentar esta crise global. Não se pode apagar um incêndio com gasolina e nosso planeta está literalmente pegando fogo.”

A indústria de combustíveis fósseis está usando a invasão da Ucrânia pela Rússia para expandir os investimentos em petróleo e gás. A guerra mostra claramente quão perigosa é nossa dependência de um sistema de combustíveis fósseis, especialmente um que concentra o poder nas mãos de elites e pessoas como Putin.

Os oligarcas de combustíveis fósseis têm controle sobre pontos de estrangulamento no sistema que podem ter um impacto impressionante no preço e na disponibilidade desses combustíveis. Ao se apressar para fabricar mais combustíveis fósseis, os governos nos afundarão ainda mais em conflitos, vulnerabilidade e instabilidade, e tudo isso só fará com que a crise climática piore.

O mundo deve travar uma batalha para eletrificar tudo e reduzir a demanda de combustíveis fósseis por amor à paz. Os principais países estão rapidamente deixando de depender desses combustíveis:

 As principais economias estão acelerando sua transição para combustíveis renováveis por necessidade devido à guerra atual. Os líderes da UE planejam acelerar o Green Deal (Acordo Verde) e reduzir o uso de gás. A Alemanha investirá 220 bilhões de dólares em energia verde nos próximos quatro anos. Autoridades do Reino Unido dizem que a implementação de energia limpa é agora uma “questão de segurança nacional”. A China anunciou a meta de implementar 450 GW de energia eólica e solar em suas regiões desérticas. Essas iniciativas são bem-vindas, mas constituem apenas um passo na direção certa para garantir a manutenção de um planeta habitável.

No entanto, devemos agir mais rápido para proteger as pessoas por meio de energia renovável segura, estável e soberana. Temos as soluções e agora também temos força de vontade. Podemos e devemos agir mais rápido porque quanto antes substituirmos petróleo, gás e carvão por energia renovável barata e segura, mais cedo todos poderão viver em paz.

Não queremos ver o mundo responder à guerra contra a Ucrânia dobrando a aposta nos mesmos combustíveis fósseis que nos levaram a uma crise climática. Se você quer se solidarizar com a Ucrânia e agir em prol da paz, espalhe a informação para seus amigos, familiares, líderes e banqueiros: é hora de acabar com a era do petróleo sangrento, é hora de acabar com a era dos combustíveis fósseis. Desinvista dessa indústria, apoie o Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis e preserve a biodiversidade e a paz para as gerações futuras.  

ENTRE EM AÇÃO JÁ:

Assista ao webinário do Movimento Laudato Si’ sobre o relatório do IPCC:

*Ative as legendas do YouTube. Aqui explicamos como.